Nos rincões de Mato Grosso, a Terra Indígena Sararé se estende por mais de 67 mil hectares entre os municípios de Vila Bela da Santíssima Trindade, Conquista D'Oeste e Nova Lacerda. A região, de fronteira com a Bolívia, é lar da etnia Nambikwara, que habita o território em pequenas aldeias, somando cerca de 200 indígenas. Mas é nesse mesmo território, que avança uma das maiores cicatrizes abertas pela mineração ilegal no Brasil: o Garimpo do Sararé. Com mais de 570 hectares devastados, segundo dados do sistema DETER, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), o garimpo ilegal transformou a terra indígena em palco de intensa destruição ambiental e tensão social.
Diversas operações já foram deflagradas para coibir a atividade ilegal, envolvendo ações conjuntas da Polícia Civil, Polícia Federal, Ibama e da Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Sema). Ainda assim, decisões judiciais recentes têm fragilizado os esforços das autoridades no combate aos crimes ambientais.
Foi o que revelou a reportagem do Estadão Mato Grosso, ao apurar decisões relacionadas à apreensão e posterior devolução de três veículos usados no apoio logístico ao garimpo: uma caminhonete Hilux e dois caminhões. Segundo a Polícia Civil, os veículos transportavam combustível para alimentar o maquinário de extração ilegal de ouro.
A apreensão ocorreu em abril em um inquérito que investigava a possível prática de crimes ambientais cometidos, supostamente, por J.S., M.C.A.S e R.S.S. todos já possuidores de antecedentes criminais por delitos ambientais. Em um primeiro momento, a restituição foi negada pela autoridade policial, com base na relevância dos veículos para a investigação.
“Considerando que os veículos apreendidos são potencialmente instrumentos do crime investigado, havendo diligências pendentes que dependem diretamente da manutenção de sua custódia, sendo imprescindíveis para os esclarecimentos dos fatos; indefiro o pedido de restituição dos veículos supramencionados, mantendo-se as apreensões até ulterior deliberação judicial ou até cessarem os móvitos que justificam sua custódia no âmbito investigativo”, diz trecho do despacho obtido pela reportagem do Estadão Mato Grosso.
Porém, a situação mudou de figura no dia 23 de abril, quando os três veículos foram restituídos pela juíza Tatiana dos Santos Batista, em três decisões diferentes, expedidas no mesmo dia e que restituiu os veículos para pessoas e uma empresa que não estavam arroladas como suspeitas de crimes ambientais. São elas; N.L.R.L, que já havia sido citada do despacho policial como verdadeira dona da Hilux apreendida no garimpo, J.V.S.N, dono caminhão Mercedes-Benz 1148 e que tinha como representante legal, Juberlúcio de Souza, apontado como criminoso ambiental e a empresa A de G Hawerroth Terraplanagem Ltda, proprietária do último caminhão, o Mercedez-Benz 1113.
As decisões judiciais argumentam que os verdadeiros proprietários — entre eles a empresa — não têm pendências legais e mantêm a posse regular dos veículos.
Segundo denúncias anônimas encaminhadas à reportagem, os veículos já voltaram a abastecer o garimpo ilegal. Um dos caminhões, inclusive, tombou em um dos vários pontos de difícil acesso na região do Sararé. Fontes do jornal apontam que esses veículos já são “figurinhas carimbadas” das autoridades por conta do transporte de combustíveis para o garimpo ilegal.